INDICAÇÃO GEOGRÁFICA E PROTEÇÃO DAS CRIAÇÕES DE MODA
É
importante levar para a indústria da moda a forma de defender seus direitos,
seja de forma preventiva seja após sofrer uma lesão.
Não
é raro as marcas registradas e as criações de moda (design) sofrer contrafação
e a pirataria, sendo estes os principais inimigos desse mercado extremamente dinâmico
e competitivo. Nesse contexto o direito autoral e a propriedade industrial
assumem papel de destaque.
A
indústria da moda protege seu negócio não só através do registro de marcas,
patentes e desenhos industriais mas também pela indicação geográfica.
A
indicação geográfica é pouco aplicada no Brasil, e menos aplicada ainda para os
produtos produzidos pela indústria da moda, o que nos motiva a escrever sobre o
assunto. Todos os registros junto ao INPI de denominação de origem para a
indústria da moda, são na categoria de indicação de procedência, tendo sido
concedidos na seguinte na ordem cronológica:
Nome geográfico
|
Produto
|
Data do registro
|
Vale dos Sinos
|
Couro acabado
|
19/5/2009
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Região do
Jalapão do Estado do Tocantins
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Artesanato em
Capim Dourado
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30/8/2011
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Franca
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Calçados
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7/2/2012
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Pedro II
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Pedras preciosas
de Pedro II e joias artesanais de opalas de Pedro II
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3/4/2012
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Paraíba
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Têxteis em
algodão colorido
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16/10/2012
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Divina Pastora
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Renda de agulha
em lacê
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26/12/2012
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Cariri Paraibano
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Renda renascença
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24/9/2013
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Região das
Lagoas Mandaú-Manguaba
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Bordado Filé
|
19/4/2016
|
Para
entender como a indicação geográfica pode beneficiar a indústria da moda,
necessário saber alguns conceitos, definidos na Lei nº 9.279/96, que regula a
matéria no âmbito nacional e separa a indicação geográfica em duas modalidades:
indicação de procedência e denominação de origem, assim conceituando-os:
‘’Constitui INDICAÇÃO GEOGRÁFICA a indicação de procedência ou a denominação
de origem” (art. 176, Lei 9279/96).
‘Considera-se INDICAÇÃO DE PROCEDÊNCIA o nome geográfico de país,
cidade, região ou localidade de seu território, que se tenha tornado conhecido
como centro de extração, produção ou fabricação de determinado produto ou de
prestação de determinado serviço” (Art. 177,
Lei 9279/96).
Considera-se DENOMINAÇÃO
DE ORIGEM o nome geográfico de país, cidade, região ou localidade de
seu território, que designe produto ou serviço cujas qualidades ou
características se devam exclusiva ou essencialmente ao meio geográfico,
incluídos fatores naturais e humanos (art. 178, Lei 9279/96).
Da
análise dos termos, conclui-se que para ambas, é necessário que “o local
deve ter se tornado conhecido por determinado produto ou serviço” sendo que
o que as diferencia é que na denominação de origem, o meio
geográfico, incluídos fatores naturais e humanos, é decisivo na impressão de
qualidades ou características do produto ou serviço.
Podemos
trazer estes conceitos para a realidade prática, da seguinte forma:
►
A INDICAÇÃO DE PROCEDÊNCIA tem ligação com o o
saber fazer. Significa que a região conquistou reconhecimento ao longo dos
anos pela excelência na produção ou fabricação de um produto, ou, então, na
prestação de determinado serviço. São oito no Rio Grande do Sul: Vale dos
Vinhedos e Pinto Bandeira (vinhos tintos, branco e espumante); Pampa Gaúcho
(carne bovina e derivados); Vale dos Sinos (couro acabado); Pelotas (doces);
Altos Montes (vinhos e espumantes) e Farroupilha.
►
Já a DENOMINAÇÃO DE ORIGEM tem seu registro concedido quando
as condições geográficas – como solo, clima e topografia – garantem qualidades
específicas a determinado produto ou serviço. Tem origem no termo francês terroir,
utilizado, principalmente no caso da viticultura, para designar as aptidões
agrícolas de uma extensão territorial. São exemplos: os vinhos e espumantes do
Vale dos Vinhedos e o arroz do Litoral Norte, ambas do Rio Grande do Sul.
Qualquer
que seja a modalidade eleita, para o pedido de registro de indicação geográfica
perante o INPI é necessário que os produtores ou prestadores de serviço
estejam organizados numa entidade representativa (Ex.
associações, cooperativas). É essa entidade, munida de documento que comprove
sua legitimidade, que fará o pedido de registro.
Entretanto,
uma vez concedido o registro, todos os produtores ou prestadores de
serviço que explorem o produto ou serviço protegidos pela indicação geográfica
poderão se beneficiar dela. Em outras palavras, para fazer uso da
indicação geográfica não é necessário que os produtores ou prestadores de
serviço sejam associados à entidade representativa titular do registro. Basta
que estejam estabelecidos no local protegido e, no caso da denominação de
origem, sigam os requisitos de qualidade definidos no ato do registro.
Há
uma única exceção em que se admite que o registro seja feito diretamente em
nome do produtor ou prestador de serviço, pessoa física ou jurídica: quando ele
seja legitimado ao uso exclusivo do nome geográfico.
No
que diz respeito aos requisitos de qualidade do produto ou serviço, embora a
lei os exija somente em relação à denominação de origem, é certo que eles
também estão presentes na indicação de procedência. Isso porque, com o pedido
de registro, o requerente deve apresentar, além de instrumento oficial
delimitando a área geográfica, regulamento de uso do nome geográfico (também
chamado de caderno de especificações, dossiê ou regulamento técnico) e
comprovação de existência de estrutura de controle.
Não
raro o regulamento de uso do nome geográfico formula exigências técnicas para a
extração, produção ou fabricação do produto ou prestação do serviço, e fixa
critérios de qualidade para o produto ou serviço final. Ainda, é comum que
estabeleça normas específicas para a embalagem, rotulagem, acondicionamento e
transporte de produtos, além de responsabilidade social e ambiental. Isso
evidencia que os produtos ou serviços protegidos por indicação geográfica
passam por um mecanismo de controle de qualidade, mais ou menos rigoroso
dependendo do caso.
Como
denota-se, o selo da indicação geográfica funciona não só como um atestado de
origem, mas também, e principalmente, como um atestado de qualidade, conferindo
ao produto ou serviço identidade própria, como por exemplo:
►
O couro que se está comprando não é um couro qualquer, mas um couro proveniente
do Vale dos Sinos, extraído e produzido conforme as diretrizes da Associação
das Indústrias de Curtume do Rio Grande do Sul;
►
O brinco em capim dourado que se está comprando não é um brinco qualquer, mas
um brinco proveniente da Região do Jalapão do Estado do Tocantins, tecido
artesanalmente conforme as diretrizes da Associação dos Artesãos em Capim
Dourado da Região do Jalapão do Estado do Tocantins.
Pode
passar despercebido, mas esse selo agrega muito ao produto ou serviço, na
medida em que funciona como um indicador de qualidade, o consumidor se sente
mais à vontade, e por vezes até mesmo estimulado, a fazer aquela aquisição,
pagando até um pouco mais caro, se for o caso.
É
claro que a indicação geográfica não se aplica a todas as criações de moda, mas
somente àquelas específicas de uma determinada região, produzidas e fabricadas
conforme técnica já estabelecida entre os produtores. Por isso mesmo tem escopo
muito mais reduzido que os demais institutos de propriedade industrial, já
mencionados acima. Mas isso não significa que a indicação geográfica mereça ser
descartada. Ao contrário, trata-se de ferramenta bem interessante que se,
devidamente utilizada, tem o condão de atuar como um diferencial, agregando
valor ao produto e estimulando o consumo do bem, principalmente para
determinadas regiões mais carentes, onde usualmente as pessoas se reúnem em
cooperativas para melhorar o preço de venda de sua mercadoria ou, para garantir
a quantidade que o mercado exige.
_____________
*ADRIANA
P. B. CUALHETE – é advogada especialista em Propriedade
Intelectual, com atuação em vários segmentos, inclusive no universo Fashion, em
São José do Rio Preto e região.